terça-feira, 5 de janeiro de 2010



Eficiência é o nome do jogo

Preocupações ambientais e a necessidade de cortar custos impulsionam os projetos de conservação de energia. No Brasil, esse Mercado deve movimentar 1 bilhão de reais em 2009


José Alberto Gonçalves
Guia Exame de Sustentabilidade 2009

No final de 2007, a fábrica de poliéster e viscose da Vicunha na cidade de Americana, no interior paulista, iniciou a execução de um programa para reduzir o consumo de energia. Depois de realizar ajustes e a troca de equipamentos na sala de compressores de ar comprimido e racionalizar a produção de vapor, a fábrica deve economizar neste ano aproximadamente 6 milhões de reais em eletricidade e gás natural. Isso representa uma redução de 10% em relação aos gastos que tinha antes de colocar em prática as medidas de eficiência energética. O valor da economia obtida em um único ano é cerca de três vezes superior ao investimento que a Vicunha fez nos projetos — 1,7 milhão de reais, além de 650 000 reais custeados pela CPFL, que é obrigada, como todas as distribuidoras de energia, a destinar 0,5% de sua receita a projetos do Programa de Eficiência Energética, criado pela Aneel, agência que regula o setor. “Todo mundo na empresa ficou feliz com esses números”, afirma o engenheiro Valmir Calef, que coordenou o programa na Vicunha.

Em um dos projetos de eficiência energética implantados, a empresa têxtil contou com a ajuda da MGD, empresa paulistana especializada em serviços de conservação de energia. Esse tipo de empresa — conhecida como “esco”, do ingles energy services company — auxilia outras companhias a reduzir os gastos com energia e água e é comum no exterior, sobretudo nos Estados Unidos. Lá, o negócio da eficiência energética ganhou força após as duas crises do petróleo, na década de 70, e até o ano passado já acumulava investimentos de 20 bilhões de dólares. No Brasil, as primeiras escos surgiram no fim dos anos 80, mas só deslancharam nos últimos anos, diante da crescente preocupação das empresas com o impacto ambiental de seus negócios e da necessidade de cortar custos. O faturamento das escos brasileiras vem crescendo acima de 20% ao ano desde 2005 e deve cravar seu primeiro bilhão de reais neste ano, Segundo estimativa da Abesco, associação que reúne 57 consultorias dessa área. “Numa estimativa conservadora, o potencial e mercado para a eficiência energética no país é de 17 bilhões de reais ao ano”, diz Maria Cecília Amaral, diretora executiva da Abesco. Sua afirmação se apoia no atual estágio da eficiência energética no Brasil. Entre 1991 e 2007, o consumo de mesmo período, houve uma perda de eficiência energética de 5%. Em bom português, isso significa que o Brasil passou a gastar 5% mais energia para produzir a mesma riqueza — situação muito diferente da observada em outros países emergentes. Na China, no mesmo período, houve um ganho de eficiência energética de 44%. Na Índia, a eficiência cresceu 19%.

O potencial do Mercado para a eficiência energética no país é estimado em 17 bilhões de reais ao ano

VEJA QUADRO: O Brasil ficou para trás

INVESTIMENTOS
Atraídos pela perspectiva de crescimento, recentemente fundos de investimento, empresas de energia e fabricantes de produtos que poupam energia começaram a procurar escos brasileiras para negociar aportes de capital, associações e parcerias estratégicas.

É o caso da EBL, sociedade que reúne a BR Distribuidora e duas escos — a Ecoluz, de Salvador, e a Light Esco, do Rio de Janeiro. Criada em abril de 2008, a EBL já negocia contratos de performance para executar ações de eficiência energética em teles como Oi, Embratel, Claro e Telefônica. “Os sinais são muito promissores nesse mercado de eficiência”, diz Marco Antonio Donatelli, superintendente da Light Esco, que deve faturar perto de 140 milhões de reais neste ano, 40% mais que em 2008. O contrato com a Oi — o primeiro fechado pela empresa — estipula que a EBL invista 5,3 milhões de reais na troca dos sistemas de iluminação e ar-condicionado em 41 prédios da companhia. Só o ar-condicionado, essencial numa central telefônica, representa quase 60% do gasto das teles com energia elétrica. Até 2012, a meta da Oi é diminuir em 5% o consumo de eletricidade, o que deverá ser alcançado com melhorias na eficiência em metade de seus 800 prédios. “Eficiência energética é um item nobre de nossa política de sustentabilidade”, diz Eduardo Michalski, diretor de suprimentos da Oi.

Há, basicamente, duas maneiras de as escos lucrarem com a eficiência energética: o cliente paga pelo serviço após a conclusão do projeto, como ocorreu no caso da Vicunha, ou negocia-se um contrato de performance. Por esta última modalidade de contrato, o cliente paga à consultoria uma fração da economia de energia gerada pelo projeto durante o prazo do contrato (que geralmente não passa de cinco anos). Após esse prazo, a economia obtida fica integralmente com a empresa contratante do serviço. O projeto geralmente começa com o diagnóstico do desperdício de energia e água, prossegue com modificações nos sistemas de iluminação, ar-condicionado, ar comprimido e vapor e termina com o monitoramento dos ganhos de eficiência previstos. Também podem ser incluídosno contrato projetos de créditos de carbono no Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) de Kyoto.

Se no setor de comércio e serviços as escos encontram terreno fértil para emplacar seus contratos de performance — como o fechado entre a EBL e a Oi —, na indústria a situação é mais complicada.O principal obstáculo é o volume de investimento exigido. Enquanto nos setores de comércio e serviços os projetos costumam exigir das escos um aporte inferior a 1 milhão de reais, na área industrial os números são muito mais elevados, podendo atingir 20 milhões de reais — e nem sempre as escos têm caixa para bancá-los. Falta também uma política pública consistente para incentivar as indústrias a investir em conservação de energia. O Ministério de Minas e Energia promete anunciar até o final de 2009 uma estratégia nacional de efi ciência energética visando cortar 10% do consumo elétrico até 2030. A estratégia poderá contemplar incentivos fiscais, leilões para selecionar projetos de efi ciência e o fortalecimento do Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica (Procel), hoje focado principalmente nos selos de eficiência. O Brasil se orgulha de ter uma das matrizes energéticas mais limpas do planeta — mas é hora de aprender a usar melhor esse recurso.


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