domingo, 2 de maio de 2010


Como fazer......e como não fazer


Em Santo Antônio (acima), a concorrência funcionou e a usina deve ficar pronta antes do previsto

Equívocos do governo afastaram os maiores grupos privados da construção de Belo Monte, no Rio Xingu. No Madeira tinha dado certo. O que separou o sucesso do fracasso?

Luís Gulherme Barrucho
Revista Veja – 28/04/2010

A imensidão da hidrografia brasileira tem sido descrita desde o descobrimento. Por volta de 1500, o navegador espanhol Vicente Yáñez Pinzón batizou o Rio Amazonas de Mar Doce. Não há no planeta mananciais semelhantes. É graças aos seus rios que o país abastece três quartos de seu consumo de eletricidade. Mas, ao contrário de países como a França, que já construiu todas as suas hidrelétricas, o Brasil utiliza, atualmente, apenas 28% da capacidade de gerar energia de seus rios. A região menos explorada é a Norte, devido aos custos de investir ali.

Pois hoje são os rios da Amazônia os mais promissores para comportar grandes usinas e atender às necessidades energéticas futuras do país, utilizando uma fonte menos poluente e mais barata do que opções como termelétricas. Daí a importância de retirar do papel a Hidrelétrica de Belo Monte, no Rio Xingu, um projeto de mais de trinta anos. Deve ser saudada, portanto, a notícia de que o governo conseguiu fazer, na semana passada, o leilão que selecionou o consórcio que vai construir e administrar a usina, apesar da gritaria (em boa medida, sem nenhuma base) dos ambientalistas de ocasião.

O destino da usina, no entanto, segue incerto. Equívocos do governo nas regras da disputa afastaram os principais grupos privados interessados no projeto. A equipe de Lula corre agora para encontrar uma saída que garanta a execução das obras, recorrendo a bilhões de reais em dinheiro público.

Não precisava ter sido assim. O governo poderia simplesmente ter se espelhado no sucesso de dois leilões recentes, das usinas de Santo Antônio e Jirau, no Rio Madeira, em Rondônia. Ambos os projetos, apesar de ter estatais como sócias, são liderados por empresas privadas. Ao contrário do modelo usado na construção de Itaipu e de outras grandes hidrelétricas estatais, as empreiteiras de Jirau e Santo Antônio assumirão os riscos e serão remuneradas pela venda de energia.

Veja quadro: Nova fronteira energética

Esse sistema inverte a lógica da ineficiência e do desperdício que imperava no passado. Para os investidores privados, quanto antes girarem as turbinas, mais cedo a usina fará dinheiro. Tanto é assim que Santo Antônio e Jirau deverão iniciar suas atividades em 2012, pelo menos um ano antes do prazo previsto. Mas Lula, que tanto se guia por metáforas futebolísticas, resolveu mexer em time que estava ganhando.

O primeiro equívoco foi ter fixado o teto do preço da energia num valor considerado baixo demais. O resultado foi que as duas construtoras mais capacitadas para executar o projeto, a Odebrecht e a Camargo Corrêa, nem chegaram a entrar na disputa. Ofereceram lances apenas dois consórcios. A surpresa maior veio quando saiu o resultado do leilão. O vencedor foi o grupo formado de última hora, liderado pela estatal Chesf, que reúne empresas com poucas credenciais para um projeto de tamanha magnitude. O principal investidor privado é o grupo Bertin, experiente como frigorífico mas neófito no setor de energia. Saiu derrotado o consórcio mais sólido, no qual estavam companhias do porte da Vale, da Votorantim e da Andrade Gutierrez. "Foi a vitória do consórcio estatal sobre o privado", resumiu a VEJA o diretor de uma grande construtora.

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